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Em 2017, a Companhia Energética de Goiás (CELG), com o respaldo do governo Temer (2016-2018), foi vendida para a empresa italiana ENEL.
À época, sob a surrada ladainha de que a concessionária goiana vivia no prejuízo e prestava péssimos serviços, mais uma empresa energética era privatizada, com o aplauso das forças neoliberais de sempre.
Ainda em 2017, o que seria uma “solução” virou um pesadelo para os consumidores residenciais e o setor produtivo local que passaram a conviver com quedas constantes de energia, aumento das tarifas e demora na resolução das ocorrências.
Nem mesmo as multas milionárias aplicadas pela Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos (AGR), que totalizaram R$ 75 milhões em um curto espaço de tempo, foram suficientes para regularizar os serviços cada vez mais precários.
Cidades e regiões goianas passaram a ficar 72 horas no escuro e zonas rurais semanas sem energia elétrica.
Esses são apenas algumas das consequências desastrosas da privatização goiana, pois a real dimensão dos problemas gerados por uma empresa estrangeira que terceirizou, pasmem, 80% dos seus serviços continua sendo ocultada por um sistema de fiscalização e regulação reconhecidamente precário.
Um caos que levou até mesmo ex-defensores da privatização a se arrependerem de terem apoiado a venda da CELG aos italianos. O atual governador Ronaldo Caiado, notório representante do conservadorismo político e dos ruralistas, chegou a autorizar sua liderança na Assembleia Legislativa a apresentar um projeto de lei pedindo a rescisão do contrato com a empresa italiana, medida que está para ser aprovada pelo plenário daquela casa legislativa.
Resumo da ópera: em apenas três anos, os goianos e a unanimidade de seus representantes, de todos os matizes políticos e ideológicos, estão a um passo de reverter uma privatização apresentada como panaceia para a solução dos problemas de fornecimento de energia elétrica.
Pelo Brasil afora, as privatizações do setor elétrico, invariavelmente, seguiram pelo mesmo caminho e apresentaram os mesmos resultados.
Agora, guardadas as devidas realidades locais, mas, como num vídeo-tape, assistimos a insistência do governador Ibaneis Rocha de privatizar a Companhia Energética de Brasília (CEB), com foco na Distribuidora, seu braço principal.
Os argumentos apresentados não resistem aos fatos. O anunciado rombo só ocorreu em razão do calote sofrido pelo próprio GDF que não ressarciu a empresa e o valor mínimo da venda, a pechincha de R$ 1,4 bilhão, está longe de compensar a transferência de uma empresa estratégica como a CEB para o setor privado. De acordo com o registro da própria estatal, o lucro líquido, no ano passado, foi de R$ 119 milhões e só o segmento de distribuição de energia obteve resultado de R$ 47,7 milhões.
A CEB, ao longo de décadas, foi considerada uma das empresas energéticas mais eficientes do país. Os números demonstram isso de forma cabal. Basta dizer que a companhia ganhou, em 2019, o Prêmio Aneel de Qualidade por ser considerada a concessionária com melhor avaliação do consumidor na região centro-oeste, ou seja, superior à qualidade dos serviços prestados pela vizinha ENEL que abocanhou a CELG.
O resultado já era esperado, pois representou a combinação de três fatores fundamentais sustentados pelo valoroso corpo técnico da empresa: planejamento, conhecimento em engenharia e competência técnica. Entre as concessionárias de grande porte, acima de 400 mil unidades consumidoras, a distribuidora do Distrito Federal ficou em 7º lugar, dentre 31 empresas.
Apesar disso tudo, a CEB corre um sério risco de ser privatizada e os brasilienses ameaçados pelo mesmo pesadelo dos irmãos goianos, principalmente depois que a assembleia de acionistas da empresa, na qual o GDF tem total controle, autorizou sua venda.
O exemplo goiano, além de próximo na geografia, é eloquente em sua resultante nefasta: tarifas mais altas e serviços mais precários, além da extinção das chamadas tarifas sociais.
Nada, absolutamente nada garante que o aporte de recursos decorrente da privatização, limitados, como vimos, gerará o que o governo espera: serviços mais eficientes e de melhor qualidade, muito pelo contrário.
Por uma razão muito simples.
O setor privado, por mais bem intencionado que seja, move-se, primordialmente, pela lógica do lucro fácil e imediato. O fato de atuar em um setor econômico considerado monopólio natural não muda, mas agrava essa lógica, pois, precisamente por ser monopólio natural, tem que estar, predominantemente, sob o controle público!
O mais grave é que, como em outros setores estratégicos baseados em monopólio natural, o risco é que o capital estrangeiro – e não nacional, açambarque essas empresas, como aconteceu com a CELG. Aliás, há fortes rumores de que a mesma empresa italiana que comprou a CELG está de olho gordo na CEB em razão da contiguidade do território que facilitaria a otimização de seus custos.
Ora, bem sabemos que o cérebro central de todas essas operações privatizantes tem gabinete na Esplanada dos Ministérios e responde pelo nome de Paulo Guedes. É o mesmo que está por trás da venda de outras empresas similares, como a CEEE (RS), a CEA (AP), a Celesc (SC) e a Cemig (MG).
Trata-se do mesmo indivíduo que articula, escandalosamente, a privatização da Eletrobrás, empresa símbolo do desenvolvimento nacional ao lado da Petrobrás. Um verdadeiro crime de lesa-pátria, que contraria, inclusive, a forma como países centrais tratam a questão energética. Basta dizer que, nos EUA, a maior parte das empresas energéticas está sob controle do governo federal, em grande parte, inclusive, do próprio Exército americano, cujo Corpo de Engenheiros é o maior operador de energia elétrica do país, controlando as barragens de John Day, The Dalles e Bonneville.
É a conhecida e velha máxima professada há tempos pelo tio Sam – façam o que o eu digo, mas não façam o que eu faço, seguida à risca e religiosamente pela política externa míope de vassalagem do governo Bolsonaro.
Portanto, como vimos, não há nenhuma razão técnica muito menos financeira para o GDF vender a CEB, convicção agora reforçada por parecer emitido pelo Ministério Público de Contas do Distrito Federal que, entre outras considerações de natureza técnica e financeira, decidiu como indispensável que a decisão sobre a privatização ou não da companhia seja submetida à apreciação legislativa local e que o Tribunal de Contas manifeste-se sobre a questão.
Motivação política, muito menos, em razão do compromisso assumido em campanha pelo então candidato Ibaneis Rocha de preservar a empresa como pública perante os eleitores do Distrito Federal e os funcionários da companhia.
O que mudou de lá para cá? Nada, a não ser a reiterada confirmação da capacidade técnica e operacional da empresa…
Não vemos, também, nenhuma razão de atender ao capricho de um governo decadente que demonstrou a sua absoluta falta de compromisso com a vida dos brasileiros durante a pandemia e ameaçou a democracia e as instituições nacionais.
Muito menos a aventura de um ministro que pretende vender até mesmo a casa da mãe Joana no momento em que a economia nacional está em seu pior momento em razão da política recessiva desastrosa que já estava em curso mesmo antes da crise sanitária.
O compromisso de Guedes e Bolsonaro está associado, visceralmente, ao sistema financeiro e ao capital estrangeiro que eles tentam atrair vendendo até mesmo as joias da coroa, como a Eletrobrás, a preço de banana!
Embarcar nessa aventura resultará, inevitavelmente, em um grande desastre. Um desastre político para o governo e um custo social incalculável para a população residente e os setores produtivos do Distrito Federal, especialmente os pequenos e médios empresários, urbanos e rurais, que dependem desses serviços para o sucesso de seus empreendimentos.
Ainda há tempo para que o governador resgate seu compromisso firmado há dois anos e reforce, perante o povo de Brasília, a convicção de que, na política, vale a pena confiar na palavra de um homem público!
O PCdoB-DF soma-se, nesse momento, a todos os setores da sociedade que se mobilizam e se unem na defesa da CEB pública e contra uma privatização que ameaça o desenvolvimento econômico e social da Capital do país.

Brasília (DF), outubro de 2020
PCdoB do DISTRITO FEDERAL