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Radicalizar ampliando, e ampliar radicalizando.
Diógenes Arruda Câmara Ferreira

Um fato político discreto, mas de  proporções animadoras, ocorreu semana passada, 27 de junho, em Brasília, com a cobertura do movimento de Flávio Dino em defesa da democracia, aquando sua visita ao Ex-Presidente José Sarney. Só então ganhou destaque o que se iniciou um mês antes, com a visita de Dino a FHC (27/05) e quando ao lado da Presidenta do PCdoB, Vice-Governadora de Pernambuco, Luciana Santos, conversaram com o ex-Presidente Lula (06/06), em sua injusta e armada prisão em Curitiba. Apenas ao dirigir-se ao seu mais representativo adversário local, é que Dino teve êxito naquilo que realmente queria comunicar: a democracia e o Estado de Direito devem ser defendidos por todos os Brasileiros e Brasileiras, não se resumindo a um patrimônio exclusivo da esquerda. 



As questões nacional e democrática superam os limites da esquerda, conceitualmente, se tudo der certo. Porque também pode suceder o inverso, adverso, perverso, como tem sido, razão importante de nossas sucessivas derrotas desde o próprio Golpe de 2016.

Ou assumimos uma postura conseqüente, sem amadorismos, responsável diante da Nação e da Democracia em risco, ou subestimamos o risco e nos assoberbamos, amesquinhado-nos, em verdade.  Ou dirigimos amplas bandeiras democráticas e nacionalistas, construindo a Frente Ampla, ou, tolamente, havemos de crer que a defesa a democracia e da soberania brasileira só caibam à esquerda e perderemos a ambas e muito mais.

Desde há muito, nos momentos mais terríveis da humanidade, destacaram-se os comunistas pela grandeza com que abriram mão de seus interesses e mesmo de suas mágoas, de sua saúde, de sua vida, tudo em favor do melhor para todos. O gesto de Flávio Dino é testemunho atual de uma tradição que remonta à Frente Única Antifascista, aos Aliados, Roosevelt, Stalin e Churchill à mesma mesa, ou a ter no mesmo palanque Prestes e a Getúlio. João Amazonas tampouco hesitou em dizer a Tancredo que só o seu nome abriria os caminhos da democracia, mesmo a partir do voto indireto no Colégio Eleitoral. E não há razão para negar a contribuição de Sarney na redemocratização, ao suspender a intervenção em sindicatos, entregar o cargo ao eleito Collor, já com a aprovação da Constituição de1988.  Todas as vitórias de Dino e a republicanização do Maranhão foram posteriores a esses fatos. A firmeza de Dino sempre se equilibrou sobre a moderação da justiça, da democracia e da ética. Ele ganhou sempre na política, jamais no grito. E tampouco assumiu posturas arrogantes, odiosas, desrespeitosas com quem quer que seja. Talvez seja desse tipo de gestos generosos e claros que o Brasil precise. Essa política o leva a mudar o Maranhão. Quem vence não deve ser rancoroso, arrogante, nem tampouco confundir-se com o passado.

Mas, claro, podemos dizer, ao invés: “não vai ter golpe”, “Diretas Já é ceder ao golpe”, só a esquerda é boa, pura, suficiente  – um pedaço apenas -, e seguir de abismo em abismo, como tem sido.

Parte do trauma político da divisão dos brasileiros nessa conjuntura de guerras híbridas, vivida a partir de 2013, agravada com todas as injustiças cometidas contra o maior líder político brasileiro, Lula, consiste precisamente em condicionar o povo a uma resposta política sectária, irrefletida, pseudomoralista, a afirmar que, só a partir da “pureza” e do isolamento daqueles que sempre “estiveram certos”, superaremos a conjuntura desesperadora que o país vive. Ao fim e ao cabo, é um fio de Ariadne às avessas. Longe de nos desembaraçar do Labirinto, é precisamente aquele que nos perde.

A cada gesto, diálogo, medida de governo, evidencia-se o momento gravíssimo que o país vive, desconstituindo-se a olhos vistos diante do mundo estupefato, e com o patrocínio da mais perigosa potência imperialista. As arbitrariedades cometidas, a conspiração, a violação da soberania popular, as mentiras, a vergonha cotidiana que não cessa, a piora da vida, o medo, a fome que novamente grassa, a destruição do país, da democracia e dos direitos do povo precisam parar JÁ. Esse desejo deve ganhar os corações de todos os que desejam o melhor para o Brasil e para si mesmos(as). Trata-se da sobreviência, é preciso deter o esquartejamento do país em praça pública.

Cristalino está que o entreguismo, os gestos autoritários e a conspurcação das instituições exigem grandeza, diálogo, superar a lógica binária e construir uma ampla aliança para isolar o fascismo, deter o entreguismo lambe-botas dos EUA, desbancar a corrupção e a ditadura do rentismo parasitário, o maestro da tragédia. Há que resgatar as conquistas dos trabalhadores, ousar ter esperança, retomar o investimento e o crédito, o emprego, o desenvolvimento, que são as bases da paz. Só a partir dessa Frente Ampla conseguiremos mostrar ao povo brasileiro a luz no fim do túnel, e poderemos repetir esse gesto a tantas pessoas enganadas, que se perderam. Guerra híbrida é isso, por todos os poros dramatizar as tensões no seio do povo, destruindo as bases da convivência, envenenando a alma nacional, corrompendo, mentindo, até que não possamos sequer abraçar nossos familiares.

O que mais dói é terem dividido o povo brasileiro. Dividir para conquistar, eis a máxima que nos grita a perceber que não podemos seguir perdendo para a súcia de incompetentes, corruptos inimigos do país. É preciso ter gestos como o de Flávio Dino, esse diálogo respeitoso e democrático em favor do país. Isso não implica ter ilusões, mas dar a oportunidade histórica de sairmos desse buraco, pois já é tarde. Acreditar no isolamento como virtude e na impossibilidade do diálogo como método não significa mais firmeza, muito ao contrário. É um gesto impotente, que se basta na vacuidade do que não realiza. O elogio da derrota nem em terapia há de servir muito, quanto mais em política. A política é a esperança de um bem, dizia há muito Aristóteles, e é cada vez mais clara a necessidade de recuperar o brio da Nação Brasileira, de sua Democracia e de sua Classe Trabalhadora para sairmos desse porão do fundo do poço. Ao contrário de companheiros que se desdobram em provocações quando há no campo adversário cisões, sou daqueles que as celebra. É preciso em política, minimamente, saber fazer conta.

O PCdoB tem olho de águia, não é de bravata, nem de amadorismo. O fascismo sempre o considerou seu inimigo figadal, assim como o imperialismo. É quem desde antes do Golpe tem defendido a Frente Ampla como caminho para repactuar o País, e em cada lugar que age, na luta, no parlamento, na justiça, ouve-se de seus quadros a defesa da Frente Ampla, da Democracia e do Brasil. Ao contrário de uma visão provinciana, ciosa de sua condição periférica, cega para os dramas nacionais que a envolvem e limitam, Flávio Dino foi grande no gesto e na articulação que defende. E, assim, ao tempo que denuncia com firmeza entreguismo ditatorial de quem não defende o país, projeta a si ao Maranhão ao centro do debate sobre os dramas  que vivemos, em busca das saídas para o pais ameaçado.