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“A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Lei no 9.394/1996 – Artigo 2º da LDB – Leis de Diretrizes e base da Educação Nacional
Tendo como ponto de partida a ideia de liberdade, solidariedade e exercício pleno de cidadania que deveria permear o processo educativo, seria fácil presumir e afirmar que a educação e o ambiente escolar são espaços livres de intolerância e fundamentalismos. Mas, infelizmente essa não é realidade de nossas escolas e da educação brasileira. Como reflexo da conjuntura política e social que vivemos nos dias atuais, os nossos educandos e educadores estão em meio ao grande debate do papel e da função da educação nos debates de Gênero, Orientação Sexual, Discriminação Racial, Xenofobias, entre outros. O grande impasse é o quanto esse debate está contaminado pelo fundamentalismo e intolerância, pela dualidade imposta socialmente entre o “certo” e o “errado”.
Podemos identificar no mínimo duas vertentes desse fundamentalismo e dessa intolerância, a primeira é a rejeição e negação das raízes africanas em nosso povo, nossa cultura e nossa espiritualidade; a segunda é o combate a qualquer debate de Gênero e Sexualidade, negando de forma tácita a diversidade na existência humana, que impede a escola de dialogar com suas comunidades sobre as temáticas, que muitas vezes, é debatida nas mídias e redes sociais sem o devido embasamento.
Na discussão que cerca a diversidade cultural, social e religiosa de nossa formação como povo, sociedade, constatamos que mesmo sob protesto e resistência de muitos, estamos vivenciando um retrocesso no processo educacional, com acirramento da luta de classes e um novo avanço do modelo eurocêntrico, patriarcal e cristão na educação, que provoca grande distorção entre os princípios de uma educação libertadora e a realidade vivenciadas em nosso meio educacional, estimulando o ódio e a intolerância contra as religiões de matrizes africanas, demonizando o diferente do padrão pré-estabelecido, mascarando a realidade, invisibilizando e ocultando o crescimento do extermínio da juventude negra.
No debate de Gênero e Sexualidade, qualquer narrativa que fuja ao padrão da heteronormatividade é combatida com força e vigor sob a alegação da “doutrinação da ideologia de gênero”. Ideia que encontra respaldo na grande interferência e ingerência de algumas lideranças ligadas às mais diversas concepções de fé, através das chamadas “bancadas da Bíblia” nos legislativos municipais, estaduais e no Congresso Nacional. Editam e impõem leis com base em uma visão unilateral e fundamentalista dos princípios da fé, com o discurso da dita “Escola sem Partido”, que nós educadores preferimos chamar de “Lei da Mordaça”.
Paulo Freire dizia que “a educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa”. Nessa perspectiva, o desafio a ser enfrentado é o de não permitir que as convicções individuais que firam as liberdades sejam norteadoras da ação educativa. Que a “profissão de fé”, a interpretação literal e descontextualizada do texto bíblico, a resistência ao novo e ao divergente de nossas convicções não nos impeçam de praticar o ato de ensinar baseado na criticidade, na liberdade e no respeito, garantindo aos nossos jovens uma formação livre de princípios dogmáticos que aprisionem. Que seja uma educação aberta ao diálogo, acolhedora e emancipadora.